quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Dez segundos

Mais uma vez eu queria ter escrito isso...

Gabito Nunes

A parte ruim de ter vinte e oito anos de amores vividos é que o fim nessa altura do campeonato não deixa claro se era amor. Aos vinte você esperneia, cata um casaco de brim surrado e faz farra. Aos vinte, lágrimas de amor caem. Aos vinte, todo amor morre prematuro. Na maturidade, lágrimas quando muito escorrem, vagarosa e melancolicamente.

Aos vinte e oito, você aluga um filme do Woody Allen pra que a rejeição tenha um amigo imaginário. Há um certo glamour. Mas não há convicção de que era amor. Mas aqueles dez segundos são exatamente iguais, lá e aqui.

Quando fica decidido, em comum acordo como faz gente rica e famosa, sem gritedo e fuzuê, com luto e sem luta. Aqueles dez segundos entre o pena-não-ter-dado-certo ou foi-bom-pra-mim ou um-dia-a-gente-se-vê e o boom seco da porta cerrando antes do roteiro programado.
É quando todas madrugadas gastas com ponderações, balanças, encorajamentos e decisões são postas a perder, ficam por um triz. Aqueles dez segundos que somam o peso do corpo do outro em cima do seu numa véspera de feriado com a caixa cheia de fotos polaroide meio apagadas com os beijos que ninguém viu, tudo comprimido a 21 gramas e repassados naquele fragmento de tempo.

Tão só naquele tempo, que nem pode ser considerado tempo, visto que uma contagem regressiva não pode ser encarada como avanço, é só um espaço – o único espaço – onde ninguém sabe por que terminou. Quem deu o basta sente uma asfixia por abandono, o abandonado faz cara de quem não sabe por onde recomeçar. Putz, por que mesmo a gente tá se digladiando? Por que mesmo estamos desistindo de um troço tão difícil de encontrar? Dez segundos não é nada, é um porquê sem direito de resposta.

Todas as canções repartidas tocam em uníssono, ambos sentem uma pena de ninguém, de nada, de coisas que não aconteceram e nem acontecerão, como o futuro. É como uma ruptura diligente. Paira uma Síndrome de Estocolmo em modo mini. São dois esgaçando o bíceps na última tentativa de puxar o ex-amado pro mesmo lado da rachadura. Como cair abraçados no abismo. Dói por educação. Depois do direito de amar, vem o dever de sofrer.

Aqueles dez segundos que são os mais desprezíveis de um romance, os últimos a serem vivenciados, os primeiros que deveriam ser esquecidos, os únicos a serem lembrados infinitamente, em déjà-vus diários sempre que bate sete horas, seja da manhã, seja da noite. Pelo menos duas vezes ao dia, o relógio biológico lembra a incompetência da cabeça em desovar qualquer resquício.
Há temor pelos dez segundos. A fim de evitá-los, homens fogem, mulheres adiam. Ninguém jamais esquece os dez segundos, nem com um amor sobre o outro, aos vinte ou aos vinte e oito. Mas o tempo é um santo remédio. Mentira. Como acontece nas desgastadas polaroides, o tempo não tem cura. O tempo não cura nada, apenas destrói o que ele mesmo construiu.

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